A exploração de animais em larga escala para consumo, compromete a segurança alimentar por desperdiçar recursos críticos, prejudicar economias, comprometer a segurança dos alimentos e aumentar as vulnerabilidades a eventos extremos.
A pecuária e aquicultura industrial utilizam mal os recursos limitados necessários para alimentar a população
A pecuária e aquicultura industrial são altamente ineficiente na conversão de recursos em nutrientes. Estudos mostram que, em termos de uso da terra e calorias ou proteínas, a produção de alimentos vegetais é significativamente mais eficiente.
Além disso, a produção de ração animal destinada à pecuária industrial desvia alimentos que poderiam ser destinados diretamente às pessoas. De acordo com o relatório Global Land Outlook, da Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação, “quase um terço do valor total dos alimentos cultivados globalmente é perdido ao ser “processado” por sistemas ineficientes de pecuária”. O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) também destaca que “os ingredientes da dieta alimentar usados para a aquicultura e para pecuária podem comprometer colheitas e peixes forrageiros, que fornecem nutrientes essenciais para as famílias de baixa renda, aumentando a insegurança nutricional em regiões da África Subsaariana, Ásia e América Latina”.
A pecuária e aquicultura industrial afetam a acessibilidade dos alimentos
O aumento da exploração animal nos sistemas industriais não resulta necessariamente em preços mais baixos, em regiões, por exemplo, onde grandes integradoras da indústria de carnae dominam o mercado e limitam a competição, capturando os lucros em vez de repassá-los aos consumidores. Há evidências concretas de que essa dinâmica já ocorreu no passado.
Além disso, ela representa um risco à capacidade dos residentes locais de terem acesso a alimentos acessíveis. Uma pesquisa abrangente da Pew Commission sobre a agricultura industrializada nos EUA concluiu que “mais de 100 estudos e relatórios mencionados neste documento deixam claro que quaisquer benefícios que possam resultar do aumento do poder de mercado decorrente da industrialização não são percebidos pelas comunidades rurais afetadas.”
A pecuária e aquicultura industrial tornam o abastecimento de alimentos altamente vulnerável
O relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), “Prevenindo a Próxima Pandemia”, destacou que o “aumento da demanda por proteína animal” e a intensificação insustentável da agricultura […] em particular da pecuária são fatores que aumentam o risco da emergência de zoonoses. Esse risco, sustentado por práticas como alta densidade populacional e altos níveis de estresse dos animais, também aumentam as chances de disrupção no abastecimento alimentar. Por exemplo, surtos de influenza aviária altamente patogênica nos EUA mais que dobraram o preço dos ovos., Essas doenças podem desestabilizar a produção em fazendas por longos períodos (em alguns casos, por meses) e causar um forte impacto na subsistência dos agricultores, especialmente em países em desenvolvimento que não dispõem de recursos para compensação.
Além disso, a agricultura industrial de animais envolve longas cadeias de suprimento (abrangendo não apenas a produção e o transporte de grãos para ração, mas também etapas adicionais, como o abate e processamento), o que aumenta ainda mais as vulnerabilidades.
A pecuária e aquicultura industrial representam riscos à segurança de alimentos
Os alimentos de origem animal representam um risco desproporcional de doenças transmitidas por alimentos (DTAs), respondendo por 35% do total de DTAs, embora contribuam com apenas 18% das calorias e 37% das proteínas consumidas globalmente. Estudos mostram que países que produzem mais carne têm mais mortes por DTAs do que países de riqueza e população semelhantes. E a maioria desse impacto ocorre em países de baixa e média renda.
A pecuária e aquicultura industrial são incompatíveis com os Limites Planetários
A integridade dos limites planetários, como a integridade da biosfera, mudanças no uso da terra, uso de água doce e fluxos de nitrogênio e fósforo e mudanças climáticas – é essencial para garantir um espaço seguro para a humanidade, inclusive para apoiar a segurança alimentar. Dietas insustentáveis, impulsionadas pela produção de alimentos de origem animal, ameaçam esses limites. Por exemplo, a adoção global dos padrões alimentares atuais dos países do G20 até 2050 excederia o limite para emissões de GEE em 263%. Isso exigiria entre uma e sete Terras para sustentar este padrão. A maior parte dessa pressão vem do setor dos produtos de origem animal. O relatório “Planetary Health Check” de 2024 afirma que seis dos nove limites planetários já foram ultrapassados, ressaltando que “os sistemas alimentares estão entre os maiores vetores de degradação ambiental”. O relatório conclui que: “alinhar dietas com as recomendações da Comissão EAT-Lancet, que recomendam a redução do consumo de proteínas animais é crucial tanto para para a sustentabilidade ambiental como para a saúde humana”.
Conclusões
Além dos riscos à segurança alimentar aqui descritos, outros impactos da pecuária e aquicultura industrial, como o aumento de emissões de GEE, poluição do ar e da água, potenciais impactos adversos para pequenos agricultores e de violações de direitos trabalhistas nas cadeias industriais, representam riscos adicionais significativos. Por outro lado, sistemas alimentares mais sustentáveis têm o potencial de oferecer melhores resultados para a saúde, nutrição e gerar trilhões de dólares em benefícios econômicos anuais.
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